A combinação de atezolizumabe e bevacizumabe reduziu o risco de morte em 42% na comparação com o tratamento-padrão
Dois meses depois da FDA, a agência regulatória americana, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acaba de aprovar o uso da imunoterapia atezolizumabe associada ao antiangiogênico bevacizumabe, ambos da Roche, para a primeira linha de tratamento do carcinoma hepatocelular (câncer de fígado) metastático, irresecável ou sem tratamento prévio. O Global Cancer Observatory estima 700 mil mortes ao ano causadas pela doença, sendo o quarto tipo de câncer mais letal no mundo. Atualmente, a American Cancer Society aponta que somente 18% dos pacientes diagnosticados com câncer de fígado estarão vivos em cinco anos. No Brasil, foram 9.711 mortes em 2015, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA).
O estudo de fase III IMbrave150, publicado em maio no periódico The New England Journal of Medicine, demonstrou que a combinação de atezolizumabe com bevacizumabe foi capaz de proporcionar um ganho significativo de sobrevida global e sobrevida livre de progressão, reduzindo o risco de morte em 42% comparado ao sorafenibe, terapia-alvo aprovada em 2009. O perfil de segurança da combinação foi consistente com os dos medicamentos em monoterapia e novos efeitos adversos ou inesperados não foram identificados.
De acordo com o oncologista Gustavo Fernandes, diretor do Hospital Sírio-Libanês em Brasília, a quimioterapia convencional não tem benefício para esses pacientes. Já a terapia-alvo trouxe benefícios por muitos anos, mas foi superada pela combinação de imunoterapia e antiangiogênico largamente, com taxa de resposta muito superior, além de ganho de sobrevida global em um ano. Assim como em outras doenças em que a imunoterapia foi ativa, é real a possibilidade de que uma proporção dos pacientes esteja bem e com doença controlada em longo prazo, por anos. “É uma forte evidência de novo padrão de tratamento com potencial de transformar a história natural da doença”, considera.
“É um grande progresso a aprovação de uma nova terapia sistêmica para o carcinoma hepatocelular avançado, associada a desfechos ainda melhores do que aqueles observados previamente com outros medicamentos”, avalia Paulo Lisboa Bittencourt, coordenador da Unidade de Gastroenterologia e Hepatologia do Hospital Português-Bahia e presidente do Instituto Brasileiro do Fígado.
O hepatologista explica que a doença acomete principalmente pessoas com cirrose (98% dos casos, segundo um estudo brasileiro de 2009), causada por hepatites virais B e C, gordura no fígado (esteatose) ou consumo abusivo de álcool. Bittencourt acrescenta que a cirrose e o câncer de fígado não apresentam sintomas nos estágios iniciais. Levantamento recente do Datasus revela que 62% dos brasileiros com carcinoma hepatocelular tiveram diagnóstico tardio. A maioria deles nem sabia ser portador de cirrose.
“Quem tem carcinoma hepatocelular não tem apenas um tumor, mas duas doenças: câncer e cirrose. A depender do seu estágio, o tratamento pode incluir cirurgia, transplante de fígado, radiologia intervencionista e terapia sistêmica. No estágio avançado, apenas a terapia sistêmica tem evidência de benefício”, completa o médico.
Atezolizumabe em combinação com bevacizumabe é o primeiro e único regime de imunoterapia aprovado para o câncer de fígado. “Hoje mais de 50% dos diferentes tipos de câncer podem ser tratados com imunoterapia e esse percentual aumentará ainda mais nos próximos anos”, acredita o oncologista Gustavo Fernandes.
A Roche possui um programa de desenvolvimento para o atezolizumabe, incluindo estudos de fase III em andamento, em diferentes tipos de câncer de pulmão, geniturinário, pele, mama, gastrintestinal, ginecológico e de cabeça e pescoço. Esses estudos avaliam o atezolizumabe isoladamente ou em combinação com outros medicamentos.