Por Marco Abud
Há um ano, em março de 2020, começávamos a nos adaptar a uma realidade que, acreditávamos, passaria logo: o isolamento para conter o avanço das infecções por Covid-19. A pandemia havia sido declarada pela OMS (Organização Mundial de Saúde) no dia 11 daquele mês, as empresas que puderam aderiram ao trabalho em home office, as escolas suspenderam as aulas presenciais… Vida pessoal e profissional fundiram-se de forma imediata.
O que deveria ser passageiro acaba de comemorar o primeiro aniversário. Com a vacinação contra o Covid-19 ainda distante da maioria da população, o trabalho continua em home office, a comunicação é feita por apps de mensagens e videoconferências, as crianças permanecem em casa e com aulas online, os contatos presenciais com amigos e familiares escassearam.
Tudo isso, é claro, teve e continua tendo repercussões na saúde mental e na qualidade de vida.
Um levantamento feito pelo CFF (Conselho Federal de Farmácia) apontou alta de 17% nas vendas de antidepressivos e estabilizadores de humor em 2020. O número é até modesto se levarmos em consideração que estudos distintos realizados pela UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e Hospital das Clínicas de São Paulo sobre o aumento nos casos de ansiedade e de depressão no país chegaram a números semelhantes e elevados: entre 80% e 90%.
O sono também foi prejudicado de forma significativa neste ano de pandemia. Confirmando o que nós, profissionais especialistas, presenciamos no dia a dia com nossos pacientes, uma pesquisa realizada pelo Instituto do Sono de São Paulo depois do início da pandemia aponta que 55,1% dos brasileiros queixam-se de piora na qualidade do sono na quarentena.
Os motivos que levam às noites mal dormidas são variados e, provavelmente, familiares à maior parte de quem estiver lendo este texto: preocupação com os efeitos da pandemia, maior tempo de exposição às telas (de computador e celular devido ao trabalho, de TV por ficar direto em casa), dificuldade para iniciar o sono e a simples falta de entusiasmo diante da crise sanitária e econômica em que o país se encontra.
Com ajuda, a volta por cima é possível
Não é por serem comuns que os novos problemas relacionados à saúde da mente e ao sono devem ser passivamente aceitos. Para sintomas de ansiedade e depressão, por exemplo, buscar auxílio médico por meio de terapia online – uma modalidade que cresceu mais de 70% no mundo após o início da pandemia, de acordo com a OMS – é uma boa alternativa.
Já nos casos de necessidade de ajustes para recuperar a qualidade do sono, médicos especializados podem ajudar a contornar os padrões nocivos às horas de descanso que tenham sido criados na rotina imposta pela quarentena.
Por meio da Terapia Cognitivo-Comportamental para Insônia (TCC-I) é possível ajudar, mesmo à distância – com a possibilidade do contato virtual – pessoas a entenderem as causas do problema e desenvolverem habilidades que permitam o cuidado com fatores como estímulos externos, a higiene do sono e o relaxamento. E vale lembrar que esse tipo de metodologia também pode ser adotada como forma de melhorar outros aspectos relacionados à saúde mental, promovendo o autoconhecimento sobre a forma como lidar com situações cotidianas que podem levar à ansiedade e até mesmo à depressão. A forma como percebemos os acontecimentos à nossa volta e os interpretamos acarreta um peso emocional que vai se acumulando, como uma bola de neve, e em algum momento se torna impossível de controlar sem ajuda.
Por isso, entender os gatilhos e os hábitos que comprometem a harmonia entre saúde mental, sono e dinâmica do dia a dia enquanto a pandemia perdurar é o primeiro passo para uma retomada da qualidade de vida. Que tal fazer uma autoanálise de suas condições gerais, virar o jogo e sair desta pandemia, após a vacinação, com o equilíbrio recuperado?
Marco Abud é psiquiatra pela USP (Universidade de São Paulo) e fundador do Canal Saúde da Mente, no YouTube, com mais de 1,4 milhão de inscritos – o maior canal sobre o tema no Brasil .