*Por János Valery Gyuricza
O dia 9 de junho é o dia da imunização, no Brasil. A data tem como objetivo incentivar a população a tomar suas vacinas, ato que contribui para o aumento da expectativa de vida, ao ser uma das formas mais eficazes de se combater doenças transmissíveis.
As ações deste dia se estendem ao longo do ano e as campanhas de vacinação já fazem parte do calendário nacional de saúde. Historicamente, por meio deste tipo de ação de imunização, foi possível controlar a disseminação e a gravidade de diversas doenças, e até mesmo erradicar algumas, como a varíola e a poliomielite.
Apesar dos benefícios que as vacinas proporcionam, algumas pessoas são contra a utilização destes medicamentos por acreditarem que os riscos não justificam estes benefícios, principalmente no desenvolvimento de crianças. Para combater este tipo de pensamento, é importante comunicar com clareza sobre os riscos e os benefícios das vacinas e promover uma escolha consciente.
Dois ótimos exemplos para ilustrar a importância das vacinas são os casos de caxumba, sarampo e rubéola – doenças combatidas com a vacina tríplice viral – nos Estados do Ceará e Pernambuco, entre 2013 e 2015, e também a falta que uma vacina contra o novo coronavírus tem causado, no mundo.
Neste primeiro exemplo, depois de muitos anos com taxa de vacinação acima de 95% para o sarampo, houve uma grande queda da cobertura vacinal, que foi sucedida por um surto da doença, atingindo Pernambuco e mais 38 cidades do Ceará. Entre 2013 e 2015, foram registrados mais de 4 mil casos suspeitos da doença, que foi controlada novamente após a distribuição de mais de 5,1 milhões de doses de vacinas para a população.
Em relação ao novo coronavírus, a doença já infectou mais de 6,8 milhões de pessoas ao redor do mundo, com quase 400 mil casos fatais. A doença (COVID-19, causada pelo coronavírus SARS-CoV-2) é nova em humanos e, por isso, até o momento não se identificou um tratamento específico e eficaz.
Diversos remédios utilizados para o combate de outras doenças estão sendo testados, mas nenhum obteve resultados satisfatórios no tratamento eficaz da doença, tanto por não comprovarem benefícios claros, quanto por apresentarem efeitos colaterais graves. Por isso, o principal objetivo da comunidade médica e científica, atualmente, é desenvolver medicamentos e vacinas voltadas para a COVID-19.
O trabalho não é fácil. A produção de vacinas imunizantes obedecem protocolos rígidos e passam por diversas fases até chegar à população. Depois de identificar o agente causador da doença, é necessário encontrar fragmentos do vírus, que chamamos de antígenos, capazes de estimular o corpo a produzir defesas eficientes – anticorpos – contra a doença estudada. Até agora, já comprovamos que o vírus induz a formação de anticorpos, mas ainda não sabemos se estes anticorpos são protetores ou não. Existem casos de doenças que levam a produção de anticorpos que em nada funcionam para levar à cura espontânea, como o HIV, por exemplo.
A fase de teste também é longa. Para isso, diversos testes em animais são realizados, até que seja seguro avançar para o teste em humanos sadios, geralmente com pequenos grupos voluntários.
Os testes em humanos são ainda mais delicados e exigem diversas rodadas, chegando a diversas fases e milhares de participantes. Apenas após comprovar a eficácia em milhares de pessoas em condições naturais de presença da doença é que a produção em larga escala da vacina é autorizada, mas não antes de passar por mais uma etapa: a aprovação de autoridades regulatórias.
Em geral, a criação de uma vacina leva, no mínimo, algo entre 12 e 18 meses. Mesmo com diversas iniciativas ao redor do mundo, muitos especialistas acreditam que uma vacina segura e eficaz não seja liberada ao público antes do início de 2021.
Existem diversos caminhos possíveis para o desenvolvimento de uma vacina. Isso fica claro quando vemos a quantidade de projetos de desenvolvimento de vacinas para o novo coronavírus em andamento. No entanto, o desenvolvimento de uma vacina requer muitas etapas, que vão desde a idealização à produção em massa, passando por consecutivos testes clínicos antes de incluí-la no calendário vacinal.
Ainda, uma das questões em aberto sobre o desenvolvimento da vacina é se a imunidade desenvolvida após o contato com o vírus levaria à imunidade prolongada. Portanto, os testes que temos hoje ainda não são conclusivos. É importante entender também se a vacina causaria algum tipo de efeito colateral, já que elas seriam distribuídas para um grande número de pessoas, até mesmo para populações inteiras. A incidência de efeitos colaterais graves, mesmo que em pequena proporção, pode representar uma inversão de problemas, e não a solução que estamos procurando.
Mesmo com algumas vacinas já sendo apresentadas e até mesmo prometidas para o fim do ano, é arriscado seu uso justamente por seus curtos tempos de fabricação. Com um lançamento tão precoce, é importante que haja completa transparência no processo de desenvolvimento de seus fabricantes. Nestes casos, testes de segurança nunca deveriam ser negligenciados, mesmo no cenário em que vivemos.
Já ao lidar com aqueles que não acreditam na ciência e acabam seguindo as convicções do movimento antivacina, o melhor que podemos fazer é muni-los com informação. É comprovado que as vacinas disponíveis hoje em dia, tanto no calendário vacinal do Ministério da Saúde, quanto em clínicas particulares, são seguras. Portanto, deveria ser um dever das comunidades técnicas e científicas transformar a informação em algo acessível, mas com respeito e paciência e sem elitismos ou julgamentos.
* János Valery Gyuricza é Head de Medicina na Cuidas, startup que conecta empresas com médicos e enfermeiros para atendimentos no próprio local de trabalho. Médico formado pela Universidade de São Paulo, com residência em Medicina de Família e Comunidade no Hospital das Clínicas, na mesma universidade. É doutorando pelo Departamento de Medicina Preventiva (USP), em parceria com a Research Unit for General Practice da Universidade de Copenhague.