por Ana Luíza Calil
Em junho, o Ministério da Saúde enfim publicou duas normas que complementam a regulação da telessaúde no Brasil. Enquanto a Portaria nº 1.348/2022 regula o uso da telemedicina no Sistema Único de Saúde (SUS), a de nº 1.355/2022 cria o projeto-piloto da Unidade de Saúde Básica Digital (UBS Digital), para a atenção primária à saúde.
As normas se agregam ao microssistema que trata do tema no país, recentemente movimentado com a aprovação, pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), da Resolução da Telemedicina (Resolução nº 2.314/2022). A norma do CFM definiu o conceito, as modalidades de atendimento e fixou regras e parâmetros para essa modalidade. Antes, também havia sido regulada, pelo CFM, a telecirurgia robótica no Brasil. Na sequência, o Conselho Nacional de Enfermagem (Cofen) publicou a Resolução nº 686/2022, que normatizou a telenfermagem.
A Portaria nº 1.348/2022 do Ministério da Saúde autoriza a interação com o uso de tecnologia entre o profissional de saúde e o paciente do SUS, mas esclarece que é preciso garantir o sigilo, a privacidade e a segurança das informações. Além disso, as regras dizem respeito a todos os profissionais de saúde de forma genérica e não apenas ao médico. Outros requisitos importantes também são definidos como a regularidade de registro profissional, cuidado com as normas éticas, consentimento do paciente, respeito à privacidade e sigilo (observando a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD), além de determinar regras para a emissão de documentos e atestados e autorizar o uso da assinatura eletrônica.
Já a Portaria do Ministério da Saúde nº 1.355/2022 cria a UBS Digital, projeto-piloto com duração de 18 meses, focado na atenção primária à saúde (APS). Com isso, os municípios classificados como “rurais remotos” podem aderir ao programa e receber repasses mensais para a implantação da UBS Digital. A possibilidade de se utilizar atendimento remoto para APS não autoriza a redução da cobertura da APS no município.
As portarias do Ministério da Saúde reforçam diversos dos princípios já previstos pela Resolução do CFM, mas atuam de maneira mais ampla, visando a elaboração de políticas públicas que podem se utilizar da telemedicina. Os desafios vão além do ponto de vista normativo, visto que, as Portarias do Ministério, exigirão a evolução de sistemas operacionais e de infraestrutura do SUS para que sejam efetivamente aplicadas.
Cabe frisar que também há projetos de Lei que tramitam no Congresso Nacional que podem definir novas regras e, nesse caso, exigir adaptações para as normas infra legais em vigor.
Vivemos em um momento em que a utilização da tecnologia na medicina foi impulsionada por conta da pandemia da Covid-19. A possibilidade de realizar consultas de diversas especialidades trouxe diversas facilidades a médicos e pacientes e amplia o acesso à saúde, especialmente em cenários de dificuldades. O potencial para a telemedicina e telessaúde no Brasil é gigantesco, com previsão de US$2,12 bilhões em 2022, segundo relatório do Statista, empresa alemã especializada em dados de mercado e consumidores. Com o aumento da segurança jurídica, por meio da resolução do problema de lacuna regulatória previamente existente, mais profissionais de saúde e instituições poderão se utilizar dessas ferramentas e ampliar a gama de serviços digitais a serem ofertados.
* Ana Luíza Calil é advogada associada do Cescon Barrieu Advogados na área de Direito Público