O Dia Mundial da Segurança do Paciente, celebrado no dia 17 de setembro, este ano chama a atenção não só para a qualidade da assistência à saúde – uma prioridade global, mas também para o cuidado centrado no profissional da área. Anualmente, na data que foi definida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), profissionais se unem a acadêmicos, pesquisadores, provedores, legisladores e pacientes para abordar o tema, trazendo suas contribuições para o desenvolvimento de estratégias e melhores práticas visando a redução de riscos, danos e eventos adversos que causam prejuízos a sociedade em geral.
Para refletirmos sobre a importância do assunto, basta lembrar que diariamente médicos, enfermeiros e demais equipes envolvidas em um ambiente ambulatorial ou hospitalar atuam em um cenário extremamente dinâmico. A pandemia do Covid-19, por exemplo trouxe complexidade ao cuidado centrado no paciente, exigindo destes profissionais um alto volume de assimilação de informações, levando-os ao limite de suas capacidades produtivas, com degradações cognitivas, físicas e emocionais, e outras variáveis que exercem influência nos mais diversos contextos pessoais e laborais. Com isso, a interatividade entre processos e pessoas demanda melhor coordenação das rotinas que são dependentes umas das outras. O conhecimento precisa ser sistêmico, o que por si só potencializa a prática de habilidades como trabalho em equipe, comunicação assertiva, planejamento, tomada de decisão, pensamento crítico e velocidade de resposta.
Tais habilidades que comumente já são ditas como essenciais a profissionais de diferentes segmentos, tornam-se ainda mais necessárias para aqueles que atuam em indústrias de alta confiabilidade, como a área da saúde dada a sua natureza operacional. Fica então evidente que, para garantir a sustentabilidade de uma Cultura de Segurança do Paciente, deve-se considerar que a atenção primária comece valorizando o cuidando do próprio profissional de saúde; portanto, reconhecer que errar é humano e que pessoas são vulneráveis e comentem falhas é o primeiro passo. Diante desta afirmação, cada vez mais os hospitais incluem no planejamento estratégico a integração de sistemas de gerenciamento de risco, melhorias em aspectos de gestão da qualidade, entre outras iniciativas que promovam o desenvolvimento de seus times. Um exemplo, são as capacitações com simulações de cenários adversos com o uso de realidade virtual, e de cursos que aprimoram habilidades não técnicas, mais conhecidas como soft skills.
Na aviação, uma potente ferramenta que atinge este objetivo é o treinamento de Corporate Resource Management (CRM) – Gerenciamento de Recursos da Corporação. Obrigatório na indústria aeronáutica há mais de três décadas, originalmente era destinado aos pilotos, depois aos comissários e demais equipes. No final dos anos 70, pesquisas realizadas pela NASA e Universidade do Texas constataram que o erro humano era a principal causa dos acidentes. Tais evidências estimularam o consenso entre as empresas aéreas, indústria aeronáutica e governo quanto à necessidade de incrementar programas de capacitação em fatores humanos – uma ciência que segundo a Organização de Aviação Civil Internacional (OACI, DOC 9683), trata-se de “qualquer fator relacionado aos seres humanos, sendo este a parte mais flexível, adaptável e valiosa do sistema aeronáutico, mas também a mais vulnerável a influências que podem afetar negativamente seu comportamento”. Já a Agência de Pesquisa e Qualidade em Saúde (AHRQ, 2018), define como “o estudo das interações entre os indivíduos – sejam eles profissionais ou pacientes e seus familiares -, os equipamentos, os processos organizacionais e o ambiente da organização que visa tornar o cuidado de saúde mais seguro e efetivo”. Para ambas, o foco é a segurança.
Deste modo, tanto na aviação como na saúde, fatores humanos está se destacando no que tange ao comportamento seguro das pessoas, justamente por buscar elevar os níveis de e-ficiência das operações e o bem-estar dos indivíduos. O treinamento de CRM propicia a prática de gerenciamento moderno, visando o uso adequado e eficaz de todos os recursos disponíveis (humanos, equipamentos e informações) que interagem em um sistema corporativo. Assim, abre-se espaço para especialistas e cientistas de áreas de estudo interdisciplinar, para a reflexão quanto aos benefícios que a gestão em saúde pode ter ao compartilhar experiências e aprendizados com a aviação.
Portanto, o CRM não é apenas uma capacitação, é um programa sistêmico que trabalha a integração e confiança mútua entre os multiprofissionais; reduz falhas humanas; atua na otimização de custos, aumento do lucro e outros indicadores operacionais capazes de entregar excelentes resultados. Organizações que aplicam esta filosofia, preservam a integridade de seus colaboradores e clientes, protegem a imagem junto aos stakeholders e garantem o sucesso dos negócios. Em resumo, CRM salva vidas!
*Daniela Gonçalves, é Especialista em Fator Humano Aeronáutico, tendo sido pioneira na gestão da implementação do treinamento de CRM na maior companhia aérea da América Latina; atua como Consultora de treinamento e desenvolvimento humano e organizacional da Veraque e é Professora de cursos de gestão e Coordenadora de pós-graduação da Estácio, campus Conceição.