Dante Garcia de Paula e J. Antônio Cirino

Observar os movimentos dos grãos de areia em uma ampulheta e associá-los à variável “tempo”, inevitavelmente provocará, em nosso imaginário popular, a lembrança de um trava-língua que, desde tenra idade, o exercitamos: “o tempo perguntou pro tempo quanto tempo o tempo tem. O tempo respondeu pro tempo que o tempo tem tanto tempo quanto tempo o tempo tem”. Essa pequena anedota não é um desafio apenas para a oratória, mas, incontestemente, à reflexão dos indivíduos sobre o tempo, sua essência e seus desdobramentos nos diversos espaços de vida.

Somos feitos de tempo. Cada pessoa vivencia o seu, diferentemente do outro, e, provavelmente este seja um dos motivos pelo qual somos tão singulares em nossos comportamentos e escolhas: eis o sopro divino do destino influenciando o seu propósito e a sua passagem por estas paragens.

Contudo, ao levarmos esta realidade para o contexto das organizações, estas também se revelam em seus tempos próprios afetadas por inúmeras e complexas variáveis do micro e macroambiente. Em tempos tão disruptivos como os que temos experimentado, diversas ondas vão se formando e estabelecendo períodos e contextos próprios, os quais optamos por denominar, nestes ensaios, de “ciclos”.

A grande questão que é colocada em xeque no dia a dia é: o momento que estou vivendo está alinhado com o ciclo em que a empresa está vivenciando? Tenho a percepção, o esforço e as condições de me adaptar para acompanhar cada novo ciclo? Eu compreendo a verossímil necessidade de se desenvolver competências aos novos ciclos? Eu contribuo ou resisto frente aos novos ciclos?

As mudanças estão corriqueiramente nos transversalizando, agindo de modo a ser consequência direta das nossas atitudes diárias. Considerando o refrão da emblemática música do Legião Urbana, composta por Renato Russo, “temos nosso próprio tempo”, o quanto eu, enquanto profissional, estou conseguindo ouvir meus próprios pensamentos, meus desejos, meus anseios, para avaliar o quanto o meu tempo está, de fato, sincronizado com a instituição em que atuo?

Por outro lado, no contexto organizacional (também formado por pessoas), pairam dúvidas sobre as estratégias e decisões adotadas para o grande tabuleiro de xadrez chamado gestão. Estariam, seus enxadristas (executivos), conscientes e preparados para as transformações exigidas em cada um de seus ciclos? Como os seus propósitos e planejamento estratégico alcançam seus diversos participantes, em cada um dos ciclos? Como seus modelos de governança e relação de poder vão se transacionando em cada “novo normal”?

Há, sem dúvida, uma perene necessidade de compreensão sobre a transcendência das organizações em seus ciclos de vida, mas também é inquestionável que as melhores organizações são dinâmicas e preparadas para os tempos de novos e qualificados líderes. 

Vemos constantemente empresas com equipes que completam triênios, quinquênios, decênios e assim por diante, em situações paradoxais: alguns que habilidosamente conseguem sentir e acompanhar cada transformação, promovendo entregas cada vez mais disruptivas e sustentáveis; e outros, que optaram por recolher-se à vivência de outros tempos, quando já são novos ciclos. Como a organização deve se posicionar? Como promover mudanças compreendendo os tempos de cada um?

Fato é que, no contexto profissional e empresarial, “tempo” e “ciclos” são quase quânticos. Não há idade ideal para as pessoas, mas sim, pessoas de qualquer idade em tempos ajustados ao ideal. De mesmo modo, independentemente dos anos de vida de uma organização, o que importa são aquelas que se reinventam em ciclos ideais. 

Como exemplificado no livro Eclesiastes 3:2, “há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou”. O quanto estamos preparados para acompanhar os ciclos empresariais, de plantar novas mudas ou colher aquilo que plantamos até então?

Dante Garcia de Paula

Administrador, consultor, palestrante e professor, mestre em Saúde Coletiva, especialista em Administração Hospitalar, Gestão de Sistemas de Saúde, Economia da Saúde e Farmacoeconomia.

J. Antônio Cirino

Comunicólogo, gestor de qualidade, professor e pesquisador, doutor em Comunicação e Sociabilidade, especialista em Gestão de Projetos. Autor do livro Gestão da Comunicação Hospitalar e coordenador científico do Manual do Gestor Hospitalar da Federação Brasileira de Hospitais –FBH.