Por Monica Gabbay, endocrinologista pediátrica, Coordenadora do Ambulatório de Bomba de Insulina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenadora do departamento de DM1 do jovem da Sociedade Brasileira de Diabetes

Muito se fala sobre o diabetes do tipo 2, doença adquirida em razão de hábitos de vida, como obesidade e hipertensão, e fatores genéticos, mas o diabetes tipo 1, menos incidente, porém necessita de tratamento imediato e contínuo, ocupa um papel de coadjuvante na política pública de saúde e na cobertura das operadoras. Com esse cenário preocupante, os cerca de 580 mil DM1, jargão usado para identificar esses pacientes, muitas vezes ficam desatendidos, sem direito a tratamentos mais adequados de controle dessa enfermidade ou acesso a novas tecnologias.

O diabetes tipo 1 é uma doença autoimune e ocorre quando há uma destruição progressiva das células responsáveis pela produção de insulina no pâncreas. Essa enfermidade acomete principalmente crianças e adolescentes. Sem o hormônio insulina no organismo, não é possível metabolizar a glicose para a produção de energia.

A questão é que sem a insulina, o organismo entra em colapso, por isso a importância do uso de insulina análoga por todo a vida desses pacientes. Entre as complicações do DM1 estão o comprometimento renal, doenças cardíacas, cegueira e chance de amputações, levando o paciente ao coma ou à óbito. Para ter uma ideia, no Brasil, a expectativa de vida de uma criança com DM1 sem tratamento adequado é de 40-54 anos.

Hoje o teste de glicemia não é padrão no pronto-atendimento de crianças ou adolescentes. Por isso, é frequente ouvirmos das mães que elas procuram ajuda emergencial e ficaram sem o diagnóstico correto. O perigo é que a ausência de insulina no corpo leva à cetoacidose diabética, complicação que pode resultar em coma ou morte, se não identificada em tempo. Boca seca, urina em excesso, fraqueza e emagrecimento são sinais de DM1, e não podem ser negligenciados independentemente da faixa etária das pessoas.

Hoje o SUS oferece o tratamento à base de insulina mais simples, nem sempre adequado para todos os casos de DM1, e os estoques desse hormônio estão sempre no limite. As bombas de insulina, chamadas de pâncreas artificial, dispositivos que fazem a liberação contínua de insulina ao longo do dia, também não. Esses sistemas inteligentes fazem a liberação deste hormônio, atuando no controle da hipoglicemia ou da hiperglicemia, condições desafiadoras e graves que afetam a saúde dos pacientes.

Os planos de saúde, por outro lado, fazem o diagnóstico do diabetes tipo 1, mas não oferecem tratamentos. Os pacientes têm que comprar os medicamentos, sensores e as bombas de insulina. Ou seja, recorrem à rede pública de saúde, sobrecarregando um sistema que já trabalha no limite.

Diante desse cenário atual, no entanto, a boa notícia é que a comunidade médica, associações de pacientes e parlamentares da causa estão empenhados na aprovação de projetos de lei que visam garantir os direitos dos pacientes com DM1 bem como o seu bem-estar e qualidade de vida.

Um deles é o 4809/2023, em tramitação no Senado, que visa a modificação da Lei 9.656/1998. A alteração tem como objetivo incluir no rol de coberturas obrigatórias insumos e tecnologias aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para o tratamento de pessoas com diabetes tipo 1 no ambiente domiciliar, o que obrigaria os planos de saúde a oferecerem tratamentos. Outro é o PL 2687/2022, que classifica o diabetes do tipo 1 como deficiência para todos os efeitos legais, ampliando assim a disponibilidade de serviços para os pacientes com a doença.

É fato que precisamos dar maior protagonismo ao diabetes tipo 1. Ainda mais porque estudos internacionais indicam crescimento dessa doença em crianças e idosos. Não podemos brincar mais com essas vidas.