Realizado em 12 hospitais públicos do país, o Resilient muda paradigmas ao comprovar que a trombectomia mecânica é viável para ser incorporada na rede pública de saúde

Um estudo feito por pesquisadores brasileiros para comprovar a segurança e a eficácia da trombectomia no Sistema Único de Saúde (SUS) acaba de ser publicado no renomado The New England Journal of Medicine. O Resilient é o primeiro estudo realizado em um país em desenvolvimento para evidenciar a diminuição do grau de incapacidade (sequelas) e o custo-efetividade de tratamentos para retirada de coágulos do cérebro nos quadros graves de acidente vascular cerebral (AVC). A pesquisa atesta, ainda, a viabilidade da aplicação da terapia trombectomia mecânica (cateterismo cerebral) em pacientes do SUS.

Oito ensaios clínicos randomizados demonstraram consistentemente o benefício da trombectomia mecânica para o tratamento de AVC por oclusão de vasos grandes. No entanto, esses estudos foram realizados em países de “Primeiro Mundo” e tiveram impacto mínimo na saúde pública em países de baixa e média rendas. Nesse cenário, o estudo Resilient surgiu como um esforço colaborativo entre a Rede Nacional de Pesquisa em AVC, com financiamento do Ministério da Saúde, em 12 hospitais públicos e com 300 pacientes.

Como resultado, os pesquisadores concluíram que, quando comparado aos tratamentos medicamentosos que estão no SUS, o procedimento aumenta de 21% para 35% a independência funcional do indivíduo, além de reduzir em 16% a mortalidade ou o risco de dependência grave. Pacientes que receberam a trombectomia tiveram 2,6 vezes mais chances de ficar independentes (sem precisar de outras pessoas para as atividades diárias) e 3,4 vezes mais chances de ficar sem sequela alguma do que pacientes que fizeram apenas tratamento clínico.

Trombectomia

A trombectomia funciona como uma espécie de cateterismo, que pesca o coágulo para desobstruir o vaso sanguíneo no cérebro. Ela é aprovada desde 2015 em países como Estados Unidos, Canadá, Austrália, Holanda e Espanha.

Durante décadas, a trombólise tem sido a única opção para tratar o AVC. Refere-se a um procedimento que utiliza uma medicação administrada na veia com o objetivo de dissolver o coágulo que interrompe a circulação cerebral. Esses medicamentos são chamados de trombolíticos e funcionam muito bem nos AVCs menores. No entanto, a oclusão de grandes vasos no AVC isquêmico agudo, que causa os AVCs mais graves, está associada a baixas taxas de recanalização sob trombólise intravenosa. Nestes casos, a trombectomia mecânica representa uma nova alternativa terapêutica mais eficaz. O procedimento, indicado para reduzir a incapacidade relacionada ao AVC, usa um dispositivo para trombectomia que, ao se expandir para a artéria, prende e remove o coágulo, restabelecendo a circulação, ou aspira o coágulo que está dentro da artéria.

O estudo comparou os resultados do tratamento endovascular com stent retriever (dispositivo endovascular que recanaliza o vaso para a circulação sanguínea) e/ou tromboaspiração versus o tratamento medicamentoso clínico padrão no AVC isquêmico agudo – quando há oclusão de grande vaso.

Os centros que participaram do Resiliente foram: Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, Hospital Geral de Fortaleza, Instituto Hospital de Base de Brasília, Hospital São Paulo (Hospital Universitário da Unifesp – Escola Paulista de Medicina), Hospital Estadual Central de Vitória, Hospital de Clínicas da Unicamp (Campinas), Hospital de Base São José do Rio Preto, Hospital de Clínicas da UFPR (Curitiba), Hospital São Lucas da PUCRS (Rio Grande do Sul), Hospital das Clínicas de Botucatu e Hospital São José do Avaí (Itaperuna, Rio de Janeiro).

A publicação do estudo Resilient demonstra que o tratamento pode ser expandido para outros países de baixo e médio desenvolvimentos, que correspondem a 80% da população mundial.