Segundo advogada especialista em planos de saúde, usuários têm direito de exigir na Justiça medicamentos ou procedimentos negados

Recentemente, duas decisões liminares, uma de Brasília outra de São Paulo, determinaram o fornecimento de medicamentos de alto custo que não estavam previstos no rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). No primeiro caso, de dezembro de 2020, o juiz Flavio Augusto Martins Leite, da 24ª vara Cível de Brasília/DF, determinou que o plano de saúde autorize e custeie o fornecimento da medicação Kisqali 200 mg, necessário para tratamento e mitigação dos sintomas de um carcinoma ductal infiltrante da mama, já em estágio IV devido às metástases ósseas. Inicialmente, o pedido de fornecimento do medicamento, que é de alto custo, fora negado pelo plano, sob alegação de que ele não constava no rol mínimo obrigatório.

Em outro caso semelhante, também do fim de 2020, a juíza Maria Cláudia Bedotti, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), decidiu pela obrigação de um convênio custear o medicamento Ocrelizumabe 300 mg, para o tratamento da esclerose múltipla de um paciente. A negativa do plano, segundo a juíza, poderia “aniquilar a própria finalidade do contrato de saúde”, que é de prezar pela manutenção da vida dos usuários.

De acordo com Diana Serpe, sócia do escritório Serpe Advogados e especialista em ações relacionadas a negativas dos planos de saúde, ambas as decisões mostram a tendência da jurisprudência majoritária que entende que o rol de procedimentos da ANS é exemplificativo e que as operadoras devem disponibilizar o tratamento necessário para a cura ou controle das doenças. “Embora haja uma pequena corrente na Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça que entende que se trata de rol taxativo, a maioria esmagadora dos magistrados de todo o país segue o entendimento unânime da Terceira Turma do STJ, ou seja, permanece com o entendimento que o Rol da ANS é exemplificativo”, detalha.

Segundo a advogada, é equivocado determinar a taxatividade do rol de procedimentos da ANS por diversos motivos e fundamentos jurídicos. “A taxatividade de um rol de procedimentos que não acompanha os avanços diários da medicina não pode colocar em risco a saúde dos beneficiários dos planos de saúde, uma vez que essas pessoas buscam a saúde privada justamente por não ter do Estado serviço de saúde necessário e de qualidade para toda a população”, destaca. “Determinar a taxatividade do rol de procedimentos da ANS é determinar que a saúde dos beneficiários importa menos que a alta lucratividade das operadoras de saúde”, afirma ela.

Diana Serpe recomenda que, ao ter seu direito negado, o paciente busque a reparação na Justiça. “Na maioria esmagadora dos casos, as operadoras de saúde negam o fornecimento de medicamentos de alto custo com base na falta de previsão no rol de procedimentos da ANS. Nesses casos, o usuário deve solicitar a negativa por escrito e ingressar com processo judicial para ter seu direito garantido, com o consequente recebimento do medicamento”.

Importante lembrar que o pedido médico não precisa ser necessariamente da rede credenciada do plano. “O rol da ANS se presta a estabelecer parâmetros mínimos quanto aos procedimentos que devem ser assegurados aos beneficiários e não a limitar as obrigações dos planos de saúde. O contrato e a agência reguladora não podem restringir direito que é assegurado por lei”, conclui Diana Serpe.

PERFIL DA FONTE

Diana Serpe é bacharel em Direito pela Universidade Paulista (Unip), especialista em Processo Civil e Direito Civil pela Faculdade Damásio de Jesus e Direito Empresarial pela Unip. Sócia do Serpe Advogados. Palestrante em Direito da Pessoa com Deficiência, com ênfase nas áreas de direito de saúde e direito da educação. Forte atuação em ações relacionadas a negativas dos planos de saúde em relação ao tratamento multidisciplinar do autista e fornecimento de canabidiol e para tratamentos e fornecimentos de medicamentos de alto custo para doenças raras. Criadora do Autismo e Direito, com perfis nas redes sociais (Instagram e Facebook) que visam informar o público sobre as questões legais referentes à pessoa autista e seus familiares