Pandemia de Covid-19 leva ao crescimento exponencial de consultas a distância 

Os efeitos positivos da prática no enfrentamento à pandemia, evidenciados pela experiência internacional, levaram o Ministério da Saúde a editar portaria que regulamenta as teleconsultas em caráter excepcional no Brasil

As medidas de restrição social, adotadas por diversos países do mundo como estratégia ao enfrentamento à pandemia de Covid-19, levaram a um crescimento exponencial do número de atendimentos médicos realizados a distância. Dado o alto grau de contágio do novo coronavírus, as teleconsultas têm sido recomendadas por proporcionar mais segurança a profissionais de saúde e pacientes, e por impedir aglomerações nas urgências hospitalares, diminuindo, com isso, os riscos de se levar a contaminação para outras alas da unidade, em que já existem pacientes com a saúde fragilizada.

Na China, onde há uma enorme densidade populacional nos centros urbanos, a telemedicina foi utilizada em larga escala, sobretudo para atender a pacientes que não apresentavam os sintomas suspeitos da Covid-19, mas que precisavam de acompanhamento médico. A demanda por serviços dessa natureza registrou recordes nas maiores plataformas digitais do país, como a Tencent e a Alibaba. Em outras potências mundiais, como Taiwan, Tailândia, Japão, Coreia do Sul, França, Canadá e Estados Unidos, a estratégia também se mostrou assertiva na contenção da epidemia.


Aqui no Brasil, embora a telemedicina já seja uma realidade há mais de dez anos, seu exercício estava restrito a alguns tipos de atendimentos, como telediagnósticos e interconsultas (aquelas realizadas entre médicos). No país, como em tantos outros, ainda faltava uma legislação que regulamentasse a prática, a qual, até então, via-se travada por debates centralizados em questões mercadológicas, mas também éticas, a exemplo do cuidado com o sigilo das informações dos pacientes e de profissionais de saúde, entre outras.

LIBERAÇÃO TEMPORÁRIA

Diante dos benefícios comprovados pela experiência internacional neste cenário de pandemia, o Conselho Federal de Medicina (CFM) resolveu conceder, em meados do mês de março, a liberação temporária para que a prática fosse adotada, exclusivamente, como estratégia de enfrentamento à epidemia no país, no diagnóstico e no monitoramento de pacientes. A decisão foi elogiada e apoiada por instituições ligadas ao setor. Uma delas, a Associação Médica Brasileira (AMB), destacou que “o posicionamento do CFM foi de singular precisão, pois entregou ao país o que era preciso para o momento de crise atual: o uso específico para o que é necessário, sem risco de uso indiscriminado ou pirotécnico”.

O presidente da entidade, Lincoln Ferreira, enfatizou que a restrição do uso da telemedicina ao período de combate ao coronavírus garante os benefícios da aplicação da tecnologia ao enfrentamento da crise, ao mesmo tempo em que preserva e respeita o trabalho que vinha sendo feito de debater, de forma responsável e segura, a utilização da ferramenta de uma maneira mais ampla. “O risco de a comoção da crise servir de pretexto para que a telemedicina fosse usada de forma indiscriminada e danosa era imenso. Assim, o posicionamento do CFM foi providencial e certeiro”, pontuou Ferreira. 

Entretanto, um dia após a liberação da prática por parte do CFM, em 20 de março, o Ministério da Saúde editou uma portaria em que regulamenta a telemedicina, em caráter extraordinário, porém com uma grande diferença: a possibilidade para que os atendimentos a distância fossem estendidos a outras necessidades médicas, que não apenas aqueles relacionados à Covid-19. A portaria do Ministério da Saúde para utilização da telemedicina permitiu aos médicos fazer consultas por meio de tecnologias interativas de comunicação, monitorar pacientes, além de emitir atestados, receitas médicas e determinar o isolamento domiciliar.

AVANÇO

Para a Sociedade Brasileira de Informática e Saúde (SBIS), a liberação da prática, além de ser um avanço, acompanha o comportamento adotado pelas principais potências mundiais que enfrentaram o problema da pandemia. A entidade enfatizou, em Nota, a importância do uso da tecnologia “para identificação, contenção e tratamento da epidemia de Covid-19 em todo o mundo”. 

“A aplicação da telemedicina, por meio da teletriagem, teleconsulta, teleinterconsulta, telediagnóstico e telemonitoramento, contribui de forma significativa para a realização da assistência médica sem a exposição de todos os envolvidos ao risco de contágio, como o paciente, os profissionais de saúde que o atendem, os demais profissionais da unidade visitada e os demais pacientes presentes no estabelecimento”, destaca a Nota. 

De acordo com a SBIS, a tecnologia favorece, ainda, que médicos testados positivo, mas assintomáticos, possam atender mesmo estando em quarentena, de forma não presencial, evitando, assim, a redução da capacidade de atendimento justamente neste momento de altíssima demanda.

COMPROVAÇÃO
Corrobora com a opinião da SBIS um artigo, veiculado no dia 11 de março em uma das mais conceituadas publicações da área médica no mundo, o New England Journal of Medicine (NEJM), sobre o papel fundamental da telemedicina na luta contra a Covid-19.

Dentre os benefícios citados pelo artigo, destacam-se: a triagem mais eficiente, que pode ser iniciada com uso de bots; e os robôs, que interagem automaticamente com os pacientes, resolvem dúvidas e adiantam o registro da história clínica por meio de fluxos predefinidos, selecionando os casos que necessitam da interação remota de um profissional ou já realizando o agendamento do exame naqueles que não necessitam. “Esse processo evita a exposição e a contaminação em larga escala, possibilitando que a história de contágio seja esclarecida e a gravidade do paciente avaliada, resultando na indicação do tratamento ou do encaminhamento, quando necessário”, destaca a SBIS.

CRESCIMENTO

No Brasil, a telemedicina tem sido oferecida em diferentes plataformas digitais, como Doctoralia, Teldoctor e Dr. Consulta, por exemplo. De acordo com um levantamento recente feito pelo jornal Estadão, publicado em 6 de abril, a demanda pelo atendimento médico a distância aumentou sete vezes em apenas 15 dias (logo após a publicação da portaria do Ministério da Saúde) no país. O veículo consultou as principais plataformas de serviços médicos, entre eles a telemedicina disponibilizada pelo Hospital Albert Einstein, que, desde 2012, é a principal referência neste tipo de atendimento no país. Segundo o levantamento do Estadão, o número de teleconsultas diárias no Albert Einstein saltou de 80 para 600. Deste total, 75% são para atender casos suspeitos de Covid-19.